Primeira
obra de Guimarães Rosa a sair em livro, traz nove contos, nos quais o universo
do sertão, com seus vaqueiros e jagunços, surge no estilo marcante que o
escritor iria aprofundar em textos posteriores.
- Leia a
análise de Sagarana
Elementos
estruturais e resumos
Os
narradores de "Sagarana" têm o estilo marcante criado por Guimarães
Rosa, cuja principal característica é a oralidade. No entanto, esse traço ainda
não está tão acentuado como em obras posteriores, como "Grande Sertão: Veredas"
e "Primeiras Estórias", entre outras. Considerando que a oralidade
acentuada é um dos principais obstáculos para a leitura de Guimarães Rosa, o
livro "Sagarana" é uma excelente opção para iniciar-se na obra do
autor.
Em relação
ao foco narrativo, com exceção dos contos “Minha Gente” e “São Marcos” – que
são narrados em primeira pessoa –, os demais possuem narradores em terceira
pessoa. Quanto ao tempo e ao espaço de "Sagarana", pouco há o que ser
dito. Sobre o primeiro elemento, vale destacar a linearidade da narrativa, que
se desenvolve na maior parte sob o tempo psicológico dos personagens.
O espaço é
quase sempre Minas Gerais. Mais especificamente, o interior do estado. Vale uma
atenção maior para o nome dos povoados e vilarejos dos contos. Os estados de
Goiás e do Rio de Janeiro são mencionados no livro, mas têm pouca relevância na
narrativa.
“O burrinho
pedrês”
Enredo:
Sete-de-Ouros é um burrinho decrépito que já fora bom e útil para seus vários
donos. Esquecido na fazenda do Major Saulo, tem o azar de ser avistado numa
travessia pelo dono da fazenda, que o escala para ajudar no transporte do gado.
Na travessia do Córrego da Fome, todos os cavalos e vaqueiros morrem, exceto
dois: Francolim e Badu; este montado e aquele agarrado ao rabo do Burrinho
Sete-de-Ouros.
Principais
personagens: Sete-de- Ouros (burrinho pedrês), Major Saulo, Francolim e Badu.
“A volta do
marido pródigo”
Enredo:
Lalino é um típico malandro que não aprecia o trabalho, apenas a boa vida.
Abandona o serviço na estrada de ferro e vai para o Rio de Janeiro, largando
sua mulher, Maria Rita, a Ritinha, na região. No retorno, a encontra casada com
o espanhol Ramiro. Torna-se cabo eleitoral do Major Anacleto, que, graças a
ele, ganha a eleição. Laio, como também é conhecido, reconcilia-se com Maria
Rita no fim do conto.
Principais
personagens: Lalino Salathiel, Maria Rita, Ramiro e Major Anacleto.
“Sarapalha”
Enredo: a
história de dois primos, Ribeiro e Argemiro, contagiados pela malária que se
espalhou no vau de Sarapalha. Os dois estão solitários na região, já que parte
da população morrera e os demais fugiram, entre os quais a mulher de Ribeiro,
Luísa. Argemiro, percebendo a iminência da morte e desejando ter a consciência
tranqüila, confessa o interesse pela esposa do primo. Ribeiro reage à confissão
de forma agressiva e expulsa Argemiro de suas terras, sem nenhuma complacência.
Principais
personagens: Primo Ribeiro e Primo Argemiro.
“Duelo”
Enredo:
Turíbio flagra sua mulher, Silvana, com o ex-militar Cassiano Gomes. Ao
procurar vingar sua honra, confunde-se e acaba matando o irmão de Cassiano
Gomes. Turíbio foge para o sertão e é perseguido pelo ex-militar. Nessa
disputa, os dois alternam os papéis de caça e de caçador. Cassiano adoece e,
antes de morrer, ajuda um capiau chamado Vinte-e-um, que passava por
dificuldades financeiras. Turíbio volta para casa e é surpreendido por
Vinte-e-um, que o executa para vingar seu benfeitor.
Principais
personagens: Turíbio Todo, Cassiano Gomes, Silvana e Vinte-e-um.
“Minha
gente”
Enredo:
Emílio visita a fazenda de seu tio, candidato às eleições, e apaixona-se por
sua prima Maria Irma, mas não é correspondido. Ela se interessa por Ramiro,
noivo de outra moça. Emílio finge-se enamorado de outra mulher. O plano falha,
mas a prima apresenta-lhe sua futura esposa, Armanda. Maria Irma casa-se com
Ramiro Gouveia.
Principais
personagens: Emílio (narrador), Maria Irma, Ramiro Gouveia e Armanda.
“São
Marcos”
Enredo:
José, narrador-personagem, é supersticioso, mas mesmo assim zomba dos
feiticeiros do Calango-Frito, em especial de João Mangolô. Izé, como é
conhecido o protagonista, recita por zombaria a oração de São Marcos para
Aurísio Manquitola e é duramente repreendido por banalizar uma prece tão
poderosa.
Certo dia,
caminhando no mato, Izé fica subitamente cego e passa a se orientar por cheiros
e ruídos. Perdido e desesperado, recita a oração de São Marcos. Guiando-se pela
audição e pelo olfato, descobre o caminho certo: a cafua de João Mangolô. Lá,
irado, tenta estrangular o feiticeiro e, ao retomar a visão, percebe que o
negro havia colocado uma venda nos olhos de um retrato seu para vingar-se das
constantes zombarias.
Principais
personagens: José, ou Izé (narrador), Aurísio Manquitola e João Mangolô.
“Corpo
fechado”
Enredo:
Manuel Fulô, falastrão que se faz de valente, é dono de uma mula cobiçada pelo
feiticeiro Antonico das Pedras-Águas. Este, por sua vez, tem uma sela cobiçada
por Manuel. Enquanto o protagonista se gaba de pretensas valentias, o
verdadeiro valentão Targino aparece e anuncia que dormirá com sua noiva.
Desesperado, Manuel recebe a visita do feiticeiro, que promete fechar-lhe o
corpo em troca da mula. Após o trato, há o duelo entre os dois personagens; o
feitiço parece funcionar e Manuel vence a porfia.
Principais
personagens: Manuel Fulô, feiticeiro Antonico das PedrasÁguas e Targino.
“Conversa
de bois”
Enredo:
conta a viagem de um carro de bois que leva uma carga de rapadura e um defunto.
Vai à frente Tiãozinho, o guia, chorando a morte do pai, ali transportado, e
Didico. Tiãozinho, que se tornara dependente de Soronho, angustiava- se com
este por dois motivos: ele maltratava os bois e havia desfrutado os amores de
sua mãe durante a doença do pai.
Paralelamente,
o boi Brilhante conta aos outros a história do boi Rodapião, que morrera por
ter aprendido a pensar como os homens. Há uma indignação entre os animais em
relação aos maus-tratos que os humanos lhes infligem. Agenor, para exibir a Tiãozinho
seus talentos como carreiro, obriga, de forma cruel, os bois a superar a
ladeira onde a carroça de João Bala havia tombado. Superado o obstáculo, os
bois aproveitam-se do cochilo de Agenor e puxam bruscamente a carroça, matando
seu algoz.
Principais
personagens: Tiãozinho, Didico, Agenor, Soronho e o boi Brilhante.
“A hora e a
vez de Augusto Matraga”
Enredo:
Augusto Estêves manda e desmanda no pequeno povoado em que vive. Pródigo, com a
morte do pai perde todos os seus bens. Certo dia, Quim Recadeiro dá-lhe dois
recados que alterarão sua vida: perdera os capangas para seu inimigo, o Major
Consilva, e a mulher e a filha, que fugiram com Ovídio Moura.
Augusto
Estêves vai sozinho à propriedade do major para tomar satisfação com seus
ex-capangas. O Major Consilva ordena que Nhô Augusto seja marcado a ferro e
depois morto. Ele é espancado à exaustão; depois os homens esquentam o ferro
usado para marcar o gado do major e queimam o seu glúteo. Augusto, desesperado,
salta de um despenhadeiro.
Quase
morto, o protagonista é encontrado por um casal de pretos, que cuida dele e
chama um padre para seu alívio espiritual. Nhô Augusto decide que sua vida de
facínora chegara ao fim. Recuperado, foge com os pretos para a única
propriedade que lhe restara, no Tombador. Trabalha de sol a sol para os
habitantes e para o casal que o salvara, em retribuição a tudo que fizeram por
ele. Leva uma vida de privações e árduo trabalho, com a finalidade de purgar
seus pecados e, assim, ir para o céu.
Um dia,
aparece na cidade o bando de Joãozinho Bem-Bem, o mais temido jagunço do
sertão. Nhô Augusto e o famigerado jagunço tornam-se amigos à primeira vista e,
depois da breve estada, despedem-se com pesar. Com o tempo, Nhô Augusto resolve
sair do Tombador, pressentindo a chegada da “sua hora e vez”. Encontra-se por
acaso com Joãozinho Bem-Bem, que está prestes a executar uma família, como
forma de vingança. Nhô Augusto pede a Joãozinho Bem-Bem que não cumpra a
execução. O jagunço encara essa atitude de Nhô Augusto como uma afronta e os dois
travam o duelo final, no qual ambos morrem.
Sobre
Guimarães Rosa
João
Guimarães Rosa nasceu em 27 de junho de 1908 na cidade de Cordisburgo, Minas
Gerais. Autodidata, começou ainda criança a estudar diversos idiomas, iniciando
pelo francês, quando nem completara 7 anos. Em 1925 matriculou-se na Faculdade
de Medicina da Universidade de Minas Gerais, formando-se em 1930. No mesmo ano,
casou-se com Lígia Cabral Penna, com quem teve duas filhas.
Passou a
exercer a profissão de médico no interior de Minas Gerais, onde teve um
primeiro encontro com os elementos e a realidade do sertão. Durante a Revolução
Constitucionalista de 1932 atuou como médico voluntário. Mais tarde foi
aprovado no concurso e ingressou na Força Pública. Em 1934 foi aprovado em um
concurso para o Itamaraty e exerceu diversas funções diplomáticas no exterior,
tais como a de cônsul em Hamburgo, na Alemanha – onde conheceu Aracy Moebius de
Carvalho (Ara), sua segunda mulher. De volta ao Brasil, em 1951, assumiu outros
cargos no Itamaraty, sendo promovido em 1958 a ministro de primeira classe,
cargo correspondente a embaixador.
Ao lado de
sua atividade profissional, como médico ou como diplomata, Guimarães Rosa nunca
deixou de escrever. Tinha também paixão por aprender outros idiomas. Seus conhecimentos
nesse campo impressionavam pela amplitude: falava fluentemente alemão, francês,
inglês, espanhol, italiano e esperanto, além de um pouco de russo. Lia em
sueco, holandês, latim e grego. Havia estudado também a gramática das seguintes
línguas: húngaro, árabe, sânscrito, lituano, polonês, tupi, hebraico, japonês,
tcheco, finlandês e dinamarquês.
A estreia
literária de Guimarães Rosa se deu em 1929, quando a revista “O Cruzeiro”
publicou alguns contos seus, vencedores de um concurso literário da edição. Seu
primeiro livro, a coletânea de contos Sagarana, foi publicado em 1946 e chamou
muita atenção pelas inovações técnicas e riqueza de simbologias.
O escritor
fez, em maio de 1952, um percurso de 240 quilômetros no sertão mineiro, durante
dez dias, conduzindo uma boiada. Na viagem, anotou expressões, casos,
histórias, procurando apreender de forma mais profunda aquele universo com o
qual tinha contato desde a infância. Seu intuito era recriar literariamente o
sertão, dando voz a seus personagens. Dessa viagem resultou seu único romance,
"Grande Sertão: Veredas", publicado em 1956 e tido como um dos mais
importantes textos da literatura brasileira de todos os tempos.
Em 1961,
Guimarães Rosa recebeu da Academia Brasileira de Letras o Prêmio Machado de
Assis pelo conjunto de sua obra. Candidatou-se à Academia Brasileira de Letras,
pela segunda vez, em 1963 e foi eleito por unanimidade. Mas não foi empossado
imediatamente, porque adiou a cerimônia enquanto pôde. Dizia ter medo de morrer
no dia do evento. Só tomou posse em 16 de novembro de 1967. Três dias depois,
em 19 de novembro, morreu subitamente em seu apartamento no Rio de Janeiro, de
infarto.
Suas
principais obras são: "Sagarana" (1946), "Grande Sertão:
Veredas" (1956), "Corpo de Baile" (1956; atualmente é publicada
em três volumes: "Manuelzão e Miguilim", "No Urubuquaquá, no
Pinhém" e "Noites do Sertão") e "Primeiras Estórias"
(1962).
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